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S E R M É D I C O • 2 7 base, incluindo risco de suicídio e baixa funcionalidade. No entanto, também é necessário ponderar que ainda carecemos de dados quanto ao seguimento de longo prazo das técnicas que foram desenvolvidas mais recentemente. De qualquer forma, é importante sempre trazer à tona essa ponderação, pois não se pode prometer nenhum resultado a esses pacientes, que muitas vezes estão desesperados dada a gravidade e refratariedade de seus transtornos. Sobre isso, também surge outro importantíssimo ponto: o procedimento neurocirúrgico em Psiquiatria é reservado sempre a pacientes refratários, ou seja, àqueles que não responderam a nenhum outro tipo de tratamento. Assim, para garantir o adequado uso, oposto à forma indiscriminada como era empregada no passado, antes de se indicar a psicocirurgia a um paciente com TOC, por exemplo, é necessário se certificar de que foram testados o tratamento com ao menos dois inibidores seletivos da recaptação de serotonina, clomipramina, potencialização com antipsicóticos (risperidona, haloperidol e aripiprazol) — sendo necessária apenas uma tentativa — e ao menos vinte sessões de terapia cognitivo-comportamental com exposição e prevenção de resposta. Sem isso, não se deve indicar psicocirurgia no TOC. Em relação aos demais transtornos, como a depressão unipolar, ainda há um nível de evidência menor, incluindo para a DBS, o que faz com que tal indicação ainda tenha um caráter muito mais experimental. Feitas essas ponderações, é inegável que a psicocirurgia evoluiu muito, distanciando-se completamente de seu passado controverso. Não apenas isso, o campo abre um interessantíssimo horizonte para o desenvolvimento de novos tratamentos que poderiam beneficiar milhares de pacientes atualmente gravíssimos e refratários, que não têm mais esperanças com os tratamentos convencionais. Ainda, esses novos estudos permitiriam uma grande ampliação do conhecimento sobre a neurocircuitaria cerebral, podendo resultar no desenvolvimento de outros tratamentos para diferentes transtornos. Infelizmente, o campo ainda é cercado pela oposição de grupos negacionistas, que buscam dissociar os transtornos psiquiátricos de qualquer substrato neurobiológico, utilizando-se de uma visão francamente anticientífica. Tal militância — no Brasil denominada de luta antimanicomial — é, na verdade, um braço do movimento antipsiquiátrico que existe no mundo todo. Em nosso país, a iniciativa abriga- -se atrás do combate à existência dos chamados “manicômios”, instituições insalubres, cuja existência, de fato, devemos combater. Contudo, tal movimento se opõe também a tratamentos psiquiátricos que nada têm a ver com esses manicômios, como a psicocirurgia moderna, que muito evoluiu, conforme aqui descrito. É, portanto, um movimento antipsiquiátrico que combate qualquer forma de intervenção médica em saúde mental, pejorativamente denominada “medicalização”. Com isso, impede o acesso de centenas de pacientes a tratamentos de vanguarda que, esses sim, poderiam “libertá-los” dos diversos “manicômios” que ainda existem em suas vidas.  *Psiquiatra e conselheiro do Cremesp (licenciado) O campo ainda é cercado pela oposição de grupos negacionistas, que buscam dissociar os transtornos psiquiátricos de qualquer substrato neurobiológico

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