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S E R M É D I C O • 4 7 R E S E N H A Os fins justificam os meios? Angelo Vattimo* Oppenheimer (2023), novo filme do diretor Christopher Nolan, estrelado por Cillian Murphy, de cara nos coloca um dilema ético frente aos avanços da Ciência: os objetivos de uma ação justificam os meios empregados para alcançá-los? De forma bastante contundente e instigante, essa questão está colocada nessa cinebiografia científica, que nos apresenta a trajetória de vida do físico e pesquisador Julius Robert Oppenheimer (1904-1967) a partir de sua maior criação — a bomba atômica —, no contexto da 2ª Guerra Mundial (1939-1945). Se na opinião de muitos o lançamento de armas atômicas contra as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, em 1945, representou um genocídio; para outros tantos, salvou inúmeras vidas, ao forçar a rendição japonesa, sem que as tropas americanas precisassem invadir o Japão por terra. Mas Oppenheimer não traz somente questões sobre a guerra e os avanços da Física — e suas consequências. A trama está repleta de diálogos que nos revelam aspectos psicológicos e conflitos entre os agentes do governo, militares e cientistas que protagonizaram a implantação do Projeto Manhattan — representando o início da corrida armamentista nuclear — que visava à criação da bomba atômica para pôr fim à guerra. De origem judaica e pioneiro no estudo da Física Quântica, Oppenheimer é retratado no filme como um cientista que tem ânsia de ver reconhecida sua genialidade, contraditório, mulherengo e cheio de conflitos em relação ao possível uso de sua invenção em confronto armado. Incumbido do projeto, ele reúne cientistas e pesquisadores da Física Avançada, principalmente de estudos sobre os buracos negros, para trabalhar no desenvolvimento da bomba atômica emLos Alamos, região desértica localizada no Novo México (EUA). Para lá também [1] DIVULGAÇÃO [1] se deslocam equipes que pesquisavam a fissão nuclear que, embora não estando diretamente vinculadas ao projeto da bomba, detinham conhecimento avançado em relação ao comportamento dos átomos e sobre um possível descontrole dos testes atômicos. O temor de uma reação nuclear ilimitada faz sua equipe questionar se o projeto poderia levar à destruição da Terra, gerando expectativas entre os cientistas e elevando o clima de suspense na plateia. A tensão chega ao seu paroxismo na hora de colocar o experimento emprática. Os bastidores de Los Alamos são apresentados por meio de cenas que revelam não somente incertezas e jogos de poder entre Oppenheimer e Leslie Groves Jr., diretor do Projeto Manhattan, mas os temores do governo americano quanto às ligações políticas e amorosas envolvendo o físico. Ele era afiliado ao Partido Comunista, embora clandestinamente, e casado com uma militante. E essas ligações serviriam de combustível para as intrigas sobre sua fidelidade ao país. O receio era de que ele repassasse informações, revelando o projeto ultrassecreto e colocando os russos à frente na descoberta da bomba atômica. Esse clima de “caça às bruxas” — que viria a ser a tônica do macarthismo no contexto da Guerra Fria — acaba por minar a confiança do governo e da opinião pública no cientista, que posteriormente a recupera, voltando a ser considerado um verdadeiro herói americano. É um filme longo, que vai além das conquistas científicas, e que pode agradar a diversos públicos. Também é capaz de nos deixar admirados com a incrível capacidade humana de criação, nos despertando para a importância do trabalho em equipe e a necessidade do emprego ético da Ciência para o benefício da humanidade. *Cirurgião geral, coloproctologista e diretor 1º secretário do Cremesp.

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