S E R M É D I C O • 4 1 R E S E N H A Ferrari, muito além de um documentário Angelo Vattimo* A recente produção Ferrari (2023), dirigida por Michael Mann e estrelada por Adam Driver, vai muito além de um simples documentário sobre automobilismo, como muitos podem pensar. O filme mostra a trajetória de Enzo Ferrari (1898-1988), um engenheiro que iniciou sua carreira como piloto, sendo tão apaixonado por seu trabalho que construiu um império no setor, consolidando e consagrando sua marca como um ícone em performance, tecnologia e beleza. Ambientado na Itália pós-guerra, o filme retrata uma época de reconstrução e de esperança, durante a qual as indústrias começaram a se reerguer dos escombros, a economia voltou a crescer e o automobilismo — que sempre foi uma paixão dos europeus, em particular dos italianos — estava em franca ascensão. É inimaginável pensar que, há mais de 70 anos, os carros já atingiam quase 300 km por hora como mostrado no filme, sendo que a segurança dos pilotos e dos espectadores era mínima. E ninguém se preocupava com isso, a ponto de os pilotos serem vistos dirigindo com cigarro na boca. O filme também revela como a sociedade via esse avanço e acusava Ferrari pelas consequências, já que muitos pilotos morriam pela falta de segurança. Felizmente, foram incorporadas, com o tempo, medidas protetivas não só nas pistas de corrida, mas na indústria automobilística como um todo. Mecânico de primeira linha, Ferrari obteve o título de engenheiro e de físico na universidade por notório saber, tamanho o seu conhecimento. Visionário e talentoso, acabou expressando toda a sua paixão pelo automobilismo nas pistas. Como piloto da Alfa Romeo, resolveu montar sua própria escuderia num determinado momento. Isso porque, naquela época, o automobilismo já era uma atividade que exigia altos investimentos. Então, ele passou a [1] DIVULGAÇÃO/STX ENTERTAINMENT [1] construir os modelos Ferrari, chegando a produzir algo em torno de 100 unidades anuais, o que sustentava a sua paixão. “Diferentemente da Jaguar (uma das concorrentes) que vai às pistas correr para vender carro, nós construímos carros e vendemos para poder correr”, diz o empreendedor, em uma frase que se tornou emblemática no filme. São reveladas no filme várias facetas da história do protagonista da Ferrari. Desde as negociações com a Ford e a Fiat — que culminaram em uma parceria com a última — até a sua persistência e sua capacidade de superação como empresário. A narrativa aborda, também, suas lutas pessoais. A morte de seu filho, Dino Ferrari, foi um golpe devastador, assim como o conturbado relacionamento com sua esposa e sócia, de quem posteriormente se separou, e suas amantes, uma das quais gerou um filho fora do casamento, que viria a assumir o papel de CEO da Ferrari na década de 1980. O grande ensinamento do filme é que, apesar de todos os desafios, Ferrari seguiu em frente e manteve o foco na empresa. A obra mostra que é preciso persistência para se atingir a perfeição, priorizando seu objetivo e a qualidade do projeto, e analisando a viabilidade de concretizá-lo. O filme pode ser visto, sob demanda, nos canais de streaming Now, Apple TV e Amazon Prime Video. Vale a pena. *Médico cirurgião e presidente do Cremesp.
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