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S E R M É D I C O • 7 [1] ARQUIVO PESSOAL/JOE DIMEO [1] Ser Médico – Como é ser o primeiro paciente a receber um transplante conjunto de face e de mãos? Qual foi o caminho até chegar à cirurgia? Joe DiMeo — Sinto que é um grande passo da Ciência, do qual fico orgulhoso de fazer parte, grato por ter sobrevivido. Já havia passado por mais de 20 cirurgias plásticas reconstrutivas, porém chegou a um ponto em que meu médico não poderia fazer mais nada, não havia mais pele saudável, e ligou para o cirurgião plástico Eduardo Rodriguez. Colocaram-me na fila dos transplantes tipo VCA (sigla em inglês para alotransplante composto vascularizado) e fui selecionado pelo fato de as queimaduras terem literalmente derretido minhas pálpebras, o que me impedia de piscar. Com o tempo, ficaria cego. Além disso, minhas pontas dos dedos foram amputadas, e eu não conseguia fazer nada de forma independente. Não queria viver daquele jeito. Fizeram inúmeros exames comigo por seis ou sete meses, para avaliar se meus nervos estavam ainda intactos e o que ainda estava funcionando dentro do meu corpo. Ser — Quais foram as circunstâncias queculminaramnoacidente?Naépoca, quais eramseus planos para o futuro? DiMeo — Aos 20 anos ninguém tem grandes planos para o futuro, estava apenas vivendo o momento. Trabalhava como técnico de laboratório, testando alimentos para verificar taxas de magnésio e potássio e outras substâncias. Às vezes, fazia o período noturno, e isso não me incomodava. Mas, naquele julho de 2018, não estava preparado para ficar sem dormir. Estava fora, fazendo algo commeu pai, quando me ligaram no meio do dia, oferecendo hora extra para o turno da noite, do que eu não me arrependo, porque precisava do dinheiro. Cochilei ao volante quando estava voltando e o meu carro capotou e pegou fogo. Passei três meses e meio em coma e, de repente, acordei. Entre o acidente e o transplante fiz muita fisioterapia, além de exercícios, para manter o peso sob controle, pois o médico avisou que engordar não seria saudável para uma cirurgia desse porte. Ser — Quais foram as principais dificuldades de ordem física, emocional e prática nessa fase? DiMeo — Conversei com outros grandes queimados, todos relataram muita dor. Eu não senti, nem pelas queimaduras, na hora do acidente, nem depois do transplante. Só bastante coceira. Tenho tendência a superar minhas dificuldades, mas apresento algumas, de ordem prática, no dia a dia, como demorar para fazer algumas coisas. Por exemplo, não consigo abrir potes apertados, nem pegar pequenos objetos do chão. Se o meu cartão de crédito cair, será difícil apanhá- -lo. Levei uma semana para montar um Dodge Charger 1969 da Lego, o que uma pessoa normal faria em menos de uma hora. E olha que a minha namorada me ajudou! Joe DiMeo, após receber os transplantes de face e de mãos

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