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EDITORIAL
Isac Jorge Filho: "A polêmica do aborto e violência sexual"


ENTREVISTA
O imunologista e professor Júlio Voltarelli aborda procedimentos em pesquisa que envolvem células-tronco adultas e embrionárias


CONSELHO 1
Cremesp fiscaliza profissionais que atuam nos serviços de urgência e emergência


MOVIMENTO MÉDICO
A necessidade de aumentar as notificações de eventos adversos


POLÍTICA DE SAÚDE E ÉTICA MÉDICA
Norma Técnica do MS não prevê Boletim de Ocorrência para abortamento legal


ENSINO MÉDICO
A pauta principal do encontro de Tarso Genro com entidades médicas foi a abertura de novos cursos de Medicina no país


MOBILIZAÇÃO
Cremesp participa de Ato Público que reuniu cerca de 2 mil pessoas contra a MP 232


DIA DA MULHER
Jovens médicas recém-formadas contam porque escolheram a Medicina como profissão


ATUALIZAÇÃO
Atendimento às vítimas de trauma: treino deve começar na Universidade


CONSELHO 2
Acompanhe a participação do Conselho em eventos importantes para a classe, realizados no mês de março


NOTAS 1
Alerta Ético


NOTAS 2
A retenção de honorários médicos


HISTÓRIA
Homenagem ao médico patologista Mário Rubens Guimarães Montenegro


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Edição 211 - 03/2005

EDITORIAL

Isac Jorge Filho: "A polêmica do aborto e violência sexual"


A polêmica do aborto e violência sexual

Nas últimas semanas, o tema do aborto em casos de violência sexual ganhou espaço na mídia, a partir de notícia de que o Ministério da Saúde editaria norma considerando desnecessário o boletim de ocorrência como documento para que o médico pudesse realizar o aborto em mulher que se dissesse vítima de estupro. As reações foram imediatas. O ministro Nelson Jobim se apressou em declarar que o médico que assim agisse seria enquadrado na lei.


Solicitada a fazer declarações pela mídia, esta presidência, após consultar o setor de obstetrícia ligado ao Conselho, deixou claro que só se manifestaria oficialmente após a divulgação da norma mas que, com os únicos dados até então publicados, ficava preocupado com a responsabilidade dos médicos e com a possibilidade de que a dispensa do B.O., sem salvaguardas, abrisse uma porta para que mulheres que não tinham sido vítimas de violência sexual assim se declarassem, levando o médico a realizar um tipo de aborto proibido por lei. Foi o bastante para que várias manifestações se fizessem, algumas realmente apaixonadas, mostrando como o assunto é polêmico. Aliás, a problemática do aborto é, sabidamente, exemplo da dificuldade no estabelecimento de diálogos sociais frente a distintas posições morais.

É fundamental que neste assunto sejam diferenciadas as posições pessoais das de um órgão responsável pela fiscalização do exercício profissional e do Código de Ética Médica. E o que diz o Código?

Artigo 42 – É vedado ao médico: “Praticar ou indicar atos médicos desnecessários ou proibidos pela legislação do país”.
Artigo 43 – É vedado ao médico: “Descumprir legislação específica nos casos de transplantes de órgãos ou tecidos, esterilização, fecundação artificial e abortamento”.

Assim, fica evidente que o médico deve respeitar a legislação em vigor. Para isso é preciso conhecê-la, até porque “a ninguém é dado o direito de descumprir a lei sob o argumento de desconhecê-la”. E o artigo 128 do Código Penal, que trata de crimes contra pessoas, diz que “não se pune o aborto praticado por médico se:

I – não há outro meio de salvar a vida da gestante (Aborto necessário);
II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando menor ou incapaz, de seu representante legal. (Aborto no caso de gravidez resultante de estupro)”.

Aqui fica um problema central: como saber se realmente houve a violência sexual? Até então se entendia que o Boletim de Ocorrência era instrumento fundamental. Assim colocava, em sua página 42, o Manual de Orientação do Cremesp para os obstetras. Assim também preconizava a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) na página 82 de seu Manual de Orientação sobre “Violência Sexual e interrupção de gestação prevista em lei” de 2004. Portanto, a notícia da dispensa do B.O. surpreendeu a maioria dos médicos. Vários foram os telefonemas pedindo orientações.

Passada essa surpresa inicial recebemos no Cremesp representantes da Comissão do Ministério da Saúde responsável pela elaboração da norma. Ficou evidente, então, que a notícia “vazada” para a mídia era incompleta, tratando apenas da dispensa do B.O. que, de resto, nunca foi obrigatório por lei, apesar de recomendado. Na ocasião, os representantes da Comissão procuraram mostrar que o noticiado representava apenas um pequeno detalhe de um programa de “Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual” e que em nada alterava a legislação, à qual os médicos devem seguir, como preconiza o Código de Ética Médica.

O Cremesp sempre se caracterizou por cumprir sua função legal mas também por atuar claramente na busca de aperfeiçoamento e atualização da lei, buscando a adequação aos novos tempos e aos avanços da medicina e da cidadania. Não é diferente neste assunto. Nesta mesma edição de nosso jornal procuramos ouvir várias opiniões sobre o tema em pauta. Teremos, na primeira quinzena de abril, em nossa sede, um Fórum de Debates sobre o aborto na mulher vítima de violência sexual.

Entre os conselheiros, que representam os mais de 87.000 médicos paulistas, existem duas unanimidades quanto ao assunto: que o Código de Ética Médica deve ser obedecido e que o tema deve ser amplamente discutido para que se chegue a uma Resolução que permita levar aos colegas os esclarecimentos necessários. Entendemos que tal Resolução deva levar em conta:

1. A Saúde Pública: desde a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, realizada em 1994 na cidade do Cairo, Egito, o aborto passou a ser encarado como problema de saúde pública. A ONU passou a considerar a violência sexual como problema da mesma esfera. Não se pode perder de vista a verdadeira catástrofe que representam os milhares de abortos clandestinos. A Organização Mundial de Saúde informa que a mortalidade global em abortos clandestinos gira em torno de 13%, sendo muito maior na América Latina. O problema é mais contundente entre adolescentes. São dados muito fortes e é impossível não levá-los em conta
2. A Legislação: ainda é vigente a legislação de 1940 que em seu Código Penal, no artigo 128 citado acima, regulamenta as condições para a não-punição de médico que tenha realizado aborto previsto em lei. Nem a recente tentativa de incluir no grupo abortos legais para os casos de malformações fetais incompatíveis com a vida, como a anencefalia, conseguiu êxito. O governo brasileiro tem acenado com a revisão e ampliação da lei do aborto, incluída no Plano Nacional de Políticas para Mulheres.
3. A Ética: é fundamental que uma Resolução de um Conselho de Ética leve em conta as implicações éticas das medidas propostas. Nessa linha, o Cremesp tem discutido o assunto em suas Plenárias e nas reuniões da Câmara Técnica e do Centro de Bioética. O tema aborto, com seus diferentes enfoques, é abordado de forma direta ou indireta em pelo menos 21 artigos do Código de Ética Médica (1, 2, 6, 7, 8, 11, 16, 20, 21, 28, 42,  43, 46, 47, 56, 59, 61, 67, 102, 103, 142).
4. A autonomia da mulher: aqui se chocam posições que defendem total autonomia reprodutiva da mulher e opiniões diferentes que entendem que tal autonomia total não deveria ser permitida, já que não leva em conta a vida do novo ser em formação. São posições diametralmente opostas e defendidas com ênfase por um lado ou outro.
5. A autonomia do médico: o Código de Ética Médica deixa claro em seu artigo 20 que é direito do médico: “Indicar o procedimento adequado ao paciente, observadas as práticas reconhecidamente aceitas e respeitando as normas legais vigentes no país”, mas ressalta, no artigo 28, que também é direito do médico “Recusar a realização de atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência”.

Entendemos que o assunto não é, em absoluto, exclusivo dos médicos, devendo ser discutido por toda a sociedade em seus diferentes setores. Também por isso, não pode a categoria médica arcar com ônus de decisões que não levem em conta suas posições como médicos e como cidadãos. O tema é polêmico e, mesmo entre os médicos, muitas posições são conflitantes. Louve-se o Ministério da Saúde pela preocupação e trabalho no sentido de estabelecer políticas adequadas na “Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes”. Também não é possível ficar insensível aos problemas que secularmente as mulheres tem enfrentado. Não se pode deixar de levar em conta que a atual legislação tem caráter punitivo sobre a mulher já vitimizada.  É indispensável procurar modificações que tirem esse caráter e que garantam acolhimento e assistência à mulher em um momento especialmente difícil em sua vida.

O Cremesp, como sempre, estará presente como espaço aberto para discussões que contribuam para a busca de melhores condições para que os médicos possam exercer seus princípios fundamentais: “A Medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade, devendo ser exercida sem discriminação de qualquer natureza, sendo o alvo de toda atenção do médico a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional”.

Isac Jorge Filho
Presidente do Cremesp


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